Correr
a ponte a cavalo:
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valentia ou doidice?
Durante a Idade Média, os reis e as suas cortes não
estavam sempre no mesmo local. Tinham caráter itinerante. Muitas vezes faziam-no
para fugir à peste – doença contagiosa e para a qual não existia cura.
A corte circulava entre Lisboa, Évora, Santarém,
Almeirim, Montemor--o-Novo, Sintra, Salvaterra de Magos…etc.
Muitas vezes, os reis, acompanhados dos seus fidalgos
mais próximos, faziam incursões nas terras circunvizinhas, para caçar, para
contactar com as autoridades locais, para ouvir os grandes senhores dos
concelhos, as dificuldades, os anseios…etc.
Conta-se que um dia, o rei D. Afonso V, de passagem
por Coruche, disse a um seu nobre cavaleiro, que integrava a comitiva régia,
que seria grande valentia correr a ponte a cavalo. Ora, a ponte sobre o rio
Sorraia em Coruche devia ser frágil e aquele exercício seria muito perigoso e
altamente arriscado.
Mas o nobre cavaleiro não quis mostrar fraqueza. Era a
sua honra que estava em jogo. Os homens honrados, os grandes senhores da
nobreza, não podiam ter medo da morte. E aquele nobre, não se negando ao
“desafio” do seu rei e senhor, foi mesmo correr a ponte a cavalo. No fim, foi
ter com o rei e, desgostoso, disse-lhe:
– “Senhor, estou para me despedir de vós por
duas razões: a uma por haverdes isto por valentia; e a outra por quererdes que,
por uma doidice, morra um tal cavaleiro como eu”.
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Fonte:
Ditos Portugueses dignos de
memória, 3ª ed., Actualização, introdução e comentários de José Hermano
Saraiva, Mem Martins, Publicações Europa-América, s.d. (adapt.).